Florestas secas e úmidas seguem caminhos opostos durante a regeneração

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Floresta em restauração na Mata Atlântica, com dezenas de espécies de árvores nativas (crédito: Pedro Brancalion)
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Florestas tropicais tem sido desmatadas a taxas alarmantes para dar lugar a campos agrícolas e pastagens. Mas a boa notícia é que estas florestas podem se regenerar uma vez que tais atividades sejam abandonadas. O processo de regeneração é chamado de “sucessão”, o qual é um dos processos mais fundamentais e amplamente aplicados na natureza. Durante a sucessão a vegetação cresce gradualmente levando à mudanças nas condições ambientais dentro da floresta. Como as espécies tem estratégias de crescimento diferentes, tais mudanças ambientais locais também levam à mudanças na composição de espécies ao longo do tempo. Entender como a sucessão funciona é crucial para melhorar as práticas de restauração de florestas e para selecionar as espécies mais adequadas a serem plantadas.

Uma equipe de ecólogos da América Latina, Estados Unidos, Austrália e Europa publicaram nesta semana um artigo na revista Nature Ecology and Evolution. Os pesquisadores acompanharam a regeneração de florestas tropicais em 10 países latino-americanos e encontraram que florestas secas e úmidas apresentam caminhos sucessionais opostos. Tal descoberta implica em uma mudança de paradigma na ecologia, com importantes consequências para a restauração de florestas.

O Prof. Dr. Lourens Poorter da Universidade de Wageningen (Holanda) e líder do artigo explica: “Espécies com características diferentes tem sucesso em ambientes diferentes. Uma característica chave das espécies de árvores é a densidade da madeira do seu tronco. Espécies que produzem madeira leve e barata tem a habilidade de crescer muito rápido quando há luz e água em abundância. No entanto, essa estratégia tem a desvantagem de menores chances de sobrevivência, especialmente em condições sub-ótimas como sob a sombra de outras árvores e sob condições de seca. Assim, as espécies de madeira leve tem um estilo de vida “rock and roll”: tem seu pico de sucesso no início da vida, vivem rápido e morrem jovens”.     

O Prof. Dr. Mark Westoby, da Universidade de Macquarie (Austrália) explica que: “Ao contrário das espécies de madeira leve, aquelas árvores que produzem madeira cara e durável podem persistir por muito tempo, especialmente em condições adversas. Essa maior chance de sobrevivência vem às custas de um crescimento mais lento”. O pesquisador complementa que esse é um passo importante para entender a mudança de composição de espécies durante a sucessão florestal: “A teoria da sucessão prevê que no começo da sucessão a abundância de luz favorece a dominância por espécies pioneiras “rápidas” que tem madeira leve. Já em estágios avançados da sucessão, a disponibilidade de recursos como luz diminui levando à dominância por espécies de crescimento lento e madeira dura.”

Para avaliar as mudanças na densidade da madeira ao longo da sucessão, a equipe de pesquisadores da rede 2ndFOR analisou a regeneração de florestas em uma escala espacial sem precedentes, usando dados coletados em 50 localidades, 1.400 parcelas e >16.000 árvores de florestas tropicais de toda América Latina.

O co-autor do estudo, professor Pedro Brancalion, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP) diz que: “Nossos resultados mostram que em florestas úmidas realmente acontece uma mudança de espécies de madeira leve para espécies de madeira dura ao longo do tempo, como prevê a teoria da sucessão. No entanto, em florestas secas acontece uma mudança no sentido oposto, de espécies de madeira dura para espécies de madeira leve ao longo da sucessão”. Brancalion é do departamento de Ciências Florestais e explica que “Essa tendência oposta acontece porque em florestas úmidas os recursos (como luz) diminuem ao longo da sucessão, enquanto que em florestas secas as condições iniciais são muito severas com altas temperaturas e pouca água. Apenas espécies de madeira dura podem tolerar essas condições extremas iniciais, mas quando crescem elas criam um microclima mais ameno sob suas copas, abrindo caminho para que espécie de madeira leve possam se estabelecer. É interessante ver que florestas úmidas e secas começam a sucessão de forma muito diferente mas que ao longo do tempo se tornam mais semelhantes entre si em termos de microclima e densidade da madeira”.  

O professor da Esalq assegura que “A importância deste estudo vai além do valor científico de se testar teorias estabelecidas”. Ele explica como o conhecimento ecológico adquirido pode ser usado para melhorar a seleção de espécies para recuperar áreas degradadas: “Nossas conclusões sugerem que a restauração de florestas em áreas com estação seca intensa deve priorizar o plantio de espécies com densidade alta da madeira (madeira dura), porque elas terão maiores chances de sobrevivência no período seco. Nas florestas úmidas é diferente, uma mistura de espécies de madeira leve e dura podem ser plantadas porque não há limitação de disponibilidade de água. Neste caso, as espécies de madeira leve crescerão rápido e formarão um dossel que abrigará as espécies de crescimento lento e madeira dura que por sua vez dominarão a floresta no longo prazo”.

Link para o artigo: http://dx.doi.org/10.1038/s41559-019-0882-6

2ndFOR – Este estudo é um produto da rede colaborativa em florestas secundárias chamado 2ndFOR. A rede envolve 85 pesquisadores de 16 países, e tem como foco estudar a ecologia, dinâmica e biodiversidade das florestas secundárias tropicais e compreender os serviços ambientais que elas provêem em paisagens modificadas pelo homem. A rede 2ndFOR é coordenada pelo Prof. Lourens Poorter, Prof. Frans Bongers, Dr. Masha van der Sande e a brasileira Dr. Catarina Jakovac, da Universidade de Wageningen na Holanda.

Florestas secundárias tropicais – Florestas secundárias são aquelas que regeneram naturalmente após a remoção da floresta original para uso pelo homem (normalmente cultivos agrícolas, pastagens e agricultura de corte e queima). Atualmente mais da metade das florestas tropicais do mundo não são florestas maduras bem conservadas, mas são florestas secundárias em processo de regeneração. Na América Latina, tais florestas cobrem 28% da zona tropical.

Saiba mais em: www.2ndfor.org | twitter: @2ndFOR1