This is a SEO version of MODELO. Click here to view full version
« Previous Page Table of Contents Next Page »vindas do Sul, pela umidade carregada por brisas marinhas ou pela evaporação local”, diz. Para ele, o desmatamento pode ter um impacto no longo prazo, mas ainda é impossível dizer se ele está relacionado com a seca atual. “O Sudeste pode não virar um deserto”, pondera, “mas os extremos climáticos podem se tornar mais intensos”. Estudos usando modelos climáticos criados pelo grupo de Marengo já previam uma redistribuição do total das chuvas, com um volume muito grande em poucos dias e estiagens mais prolongadas, algo que já tem sido observado no Sudeste e no Sul do país nos últimos 50 anos.
Além desse efeito a distância, em escala nacional, a relação entre vegetação e recursos hídricos também se dá numa escala mais local, de acordo com o engenheiro agrônomo Walter de Paula Lima, professor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da Universidade de São Paulo (USP) e
coordenador científico do Programa Cooperativo de Monitoramento Ambiental em Microbacias (Promab) do Instituto de Pesquisas e Estudos Florestais. Em seus estudos sobre o efeito das florestas (ou sua remoção) em microbacias hidrográficas, ele mostrou que a mata ciliar, que acompanha os cursos de água, ajuda a manter a boa saúde de pequenos rios. “O sistema Cantareira, que abastece São Paulo, é formado por milhares de microbacias”, conta. “As que estão mais degradadas não contribuem para o manancial.” Essa avaliação, porém, carece de dados experimentais concretos. Segundo Lima, para se saber exatamente o efeito das matas ciliares nos mananciais seria necessário estudar uma microbacia experimental em que se possa medir propriedades dos cursos d’água com e sem a proteção de floresta, sem que haja outros fatores envolvidos. Um quadro praticamente inatingível.
Uma experiência prática que reforça a importância de se preservar as matas ciliares para a manutenção dos recursos hídricos é relatada pelo biólogo Ricardo Ribeiro Rodrigues, da Esalq, especialista em recuperação de florestas nativas. Ele conta que há 24 anos a água desapareceu da microbacia de Iracemápolis, município no interior paulista. A prefeitura buscou ajuda na Esalq, e o grupo de Rodrigues implementou um projeto de conservação de solo da microbacia e de recuperação da mata ciliar que deveria estar ali. “Fui lá recentemente e levei um susto”, conta o pesquisador. O nível da represa está um pouco mais baixo, mas tem água suficiente para continuar abastecendo Iracemápolis, que teve sua população triplicada nesse período. “Toda a região está com problemas de falta de água, mas Iracemápolis não.”
As florestas afetam a saúde dos recursos hídricos por meio de sua influência nas chuvas, mas também tem importância a sua relação com as águas subterrâneas. O engenheiro Edson Wendland, professor no Departamento de Hidráulica e Saneamento da USP de São Carlos, estuda justamente o que acontece com a recarga do aquífero Guarani quando o cerrado é substituído por culturas como pastagem, cana-de-açúcar, cítricos ou eucalipto. O trabalho tem sido feito na bacia do Ribeirão da Onça, no município de Brotas, interior paulista, estudada desde os anos 1980.
Por meio de poços de monitoramento e estações climatológicas, a ideia é detalhar, antes que não sobre mais vegetação original de cerrado por ali, como se dá a recarga do aquífero Guarani sob diferentes regimes de uso do solo. “Não é possível gerenciar o que não se conhece”, diz Wendland sobre uma das fontes de água subterrânea mais importantes do Brasil. O aquífero é uma camada porosa de rochas na qual se infiltra a água das chuvas, depois liberada lentamente para os rios. Essa diferença de tempo entre o abastecimento e a descarga, consequência do trajeto lento da água pelo meio subterrâneo, é o que garante perenidade aos rios, que dependem dessa poupança hídrica.
O grupo de Wendland tem mostrado, por exemplo, que a disponibilidade de água diminui quando se substituem as pequenas árvores retorcidas do cerrado, adaptadas a viver sob estresse hídrico, por eucaliptos, que consomem bastante água e em poucos anos atingem o tamanho de corte. Medições feitas entre 2004 e 2007 mostram que as taxas de recarga têm relação íntima com a intensidade da precipitação e o porte das culturas agrícolas nessa região onde o cerrado está praticamente extinto, de acordo com artigo aceito para publicação nos Anais da Academia Brasileira de Ciências.
Isso não significa, porém, que os eucaliptos sejam vilões incondicionais. O impacto de árvores de grande porte depende, em parte, da profundidade do aquífero no ponto em que estão plantadas. Segundo Lima, os mais de 20 anos de monitoramento contínuo feito pelo Promab mostraram que a relação entre espécies florestais e água não é constante. “Onde a disponibilidade é crítica, um elemento novo pode secar as microbacias”, explica. “Mas onde o balanço hídrico e climático é bom, a diminuição de água nem é sentida.” Essas conclusões deixam claro que é necessário fazer um zoneamento de onde se pode plantar e onde a prática seria nociva, um planejamento que não existe no Brasil.
Para Wendland, a importância de entender a relação entre o cerrado e os aquíferos é crucial porque as nascentes da maioria das grandes bacias hidrográficas do país estão no domínio desse bioma. Além da importância como recurso hídrico, algumas dessas bacias – do Paraná, do Tocantins, do Parnaíba e do São Francisco – são as principais fornecedoras de água para geração de energia elétrica no Brasil.
This is a SEO version of MODELO. Click here to view full version
« Previous Page Table of Contents Next Page »