Interpretações do DNA

Bruce Weir (Crédito: Gerhard Waller - ESALQ/Acom)

Em 1967, Roland Vencovsky, professor sênior do Departamento de Genética (LGN), da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” (USP/ESALQ), fez seu mestrado em Estatística Experimental na North Carolina State University. Na ocasião, conheceu o pesquisador Bruce Weir e, desde então, a genética quantitativa passou a ser o campo de interação entre o brasileiro e o norte-americano. A convite do professor Antonio Augusto Franco Garcia (também do LGN), que fez seu pós-doutorado no Centro de Bioinformática chefiado por Bruce Weir, em 2013 o norte-americano participou como palestrante no 59.º Congresso Brasileiro de Genética, que aconteceu entre 16 e 19 de setembro em Águas de Lindóia (SP).

Atualmente, Bruce Weir é chefe do Departamento de Bioestatística da University of Washington e, entre janeiro e março, com apoio da Comissão Fullbrigth, passará seu período sabático (uma espécie de licença prêmio) na ESALQ. Durante sua permanência, o cientista pretende interagir com professores, pesquisadores e alunos de graduação e pós-graduação que estejam interessados em aprimorar seu conhecimento em Genética Estatística. Para tanto coordenará na ESALQ, entre 22/1 e 12/2/14, a edição Brasileira do Summer Institute in Statistical Genetics. Em entrevista, Weir falou sobre esse evento e estudos de genética humana realizados nos EUA.

Fale um pouco sobre o Summer Institute in Statistical Genetics?
Bruce Weir (BW): Nos EUA, o evento está em sua 18ª edição. Em 2014, realizaremos aqui na ESALQ uma versão adaptada aos interesses da ciência brasileira. É a primeira vez no Brasil e, assim como nas edições anteriores, o intuito é apresentar aos geneticistas os métodos mais modernos de análises estatísticas, bem como colocá-los em contato com os desafios representados pelos dados genéticos atuais.

Como tomou a decisão de trazer este evento para a ESALQ?
BW: Hoje as ciências biológicas em geral e a genética em particular tornaram-se quantitativas, ou seja, é cada vez mais necessário interpretar conjuntos de dados progressivamente maiores. Uma dessas áreas é a Genética Estatística, ciência à qual me dedico e, aqui na ESALQ, também temos grupos preparados para lidar com características quantitativas originadas da produção agrícola, por exemplo. Essa área tem se tornado importante porque a quantidade de dados atualmente disponível é gigantesca. As medidas são tomadas com base em bilhões de dados. As áreas como melhoramento animal e de plantas tradicionalmente fazem uso dessas técnicas. Além dos dados morfológicos, hoje os dados do DNA são um novo mundo a ser compreendido.

Sua permanência no Brasil também servirá para aprimorar seus estudos?
BW: O Brasil é um local muito interessante para se estudar genética humana, pois sua população é proveniente de uma história evolutiva muito rica, constituída a partir de uma miscigenação resultante dos movimentos migratórios. Portanto, mostra-se como um cenário mais desafiador aos estudos nessa área se comparado a outros países.

A genética humana faz parte do seu escopo de trabalho?
BW: Meu grupo de pesquisa estuda as populações europeias, mas recentemente temos nos dedicado ao levantamento de dados referentes aos povos afroamericano e hispânico. Particularmente, coordeno um programa que estuda o perfil genético de hispânicos vindos de Porto Rico, Cuba, México e República Dominicana. As populações nativas da América do Sul são importantes por serem muito antigas, e queremos compará-las com os dados dos hispânicos que estamos coletando.

De que forma os dados do DNA podem contribuir com as gerações futuras?
BW: Hoje é possível relacionar dados do DNA com doenças de natureza genética. Em outra linha, trabalhamos com genética forense, que usa evidências do DNA para identificar suspeitos de cometerem crimes, vítimas de desastres aéreos e acidentes naturais como tsunamis, etc.

Isso é o que chamamos de predição genômica?
BW: Sim, a partir de amostras de DNA conseguimos prever se a pessoa vai ter uma doença ou não. É uma suposição, não é um resultado absoluto, mas os melhoristas de animais têm obtido muito sucesso na predição da quantidade de leite produzido, por exemplo. Em humanos, os resultados ainda não são tão definitivos, mas temos resultados promissores.

Dos estudos que coordena, que resultados gostaria de destacar?
BW: Hoje conseguimos, a partir de informações contidas no DNA, identificar, por exemplo, uma pessoa que foi assaltar uma residência e cortou o dedo em um vidro. A partir da coleta de amostras de sangue, ou mesmo de unhas ou cabelos dispersos na cena, podemos fazer uma predição de características físicas daquele criminoso. É o retrato falado oriundo das milhões de informações mapeadas no DNA. Nos estudos que realizamos, a cor dos olhos e da pele já podemos predizer. No futuro, será possível produzir um holograma a partir dessas informações.

O que espera do contato com a comunidade científica brasileira?
BW: Espero que minha vinda para o Brasil possa constituir-se como uma ponte entre os cientistas dos hemisférios norte e sul.

Texto: Caio Albuquerque (17/01/2014)

Boletim 06