Piracicaba tem janeiro mais quente desde 1917

Temperaturas elevadas em janeiro e consequências para o agronegócio (Crédito: Roberto Amaral)

 

Faltando apenas dois dias para terminar o mês, janeiro de 2014 mostra-se como o mais quente e o terceiro mais seco em 97 anos. “Desde 1917, quando o Posto Meteorológico da Escola Superior de Agricultura 'Luiz de Queiroz' (USP/ESALQ) passou a operar, não tínhamos registrado médias de temperatura tão altas”, confirma Fabio Marin, professor do Departamento de Engenharia de Biossistemas (LEB).

Segundo Marin, a média das temperaturas diurnas em janeiro ficou, até 29/1, em 33,07 ºC. “Esses registros são feitos na sombra e podemos afirmar que, diante de média tão alta, os picos passaram facilmente dos 35 ºC, enquanto que a sensação térmica próxima das áreas altamente urbanizadas e pavimentadas podem ter se aproximado dos 50 ºC”.

Chuva – No caso da chuva, a média histórica de janeiro é de 230 mm, mas em 2014 este índice ficou em apenas 83 mm. No quesito chuva, pior que 2014 estão apenas os anos de 1956, com 61 mm, e de 1964, com 69 mm apenas. “Estamos registrando um evento extremo, que ocorre com baixa frequência, e é difícil prevê-lo com boa antecedência. O Posto Meteorológico da ESALQ já havia registrado índices pluviométricos baixos no último mês de 2013. Dezembro foi atípico, com 121 mm de chuva, ante os 200 mm esperados na série histórica. “Mesmo que chova bastante em fevereiro, a vazão da bacia PCJ, por exemplo, não será normalizada em pouco tempo, uma vez que o solo demandará boa parte dessa chuva. Esse será um tema presente na agenda no próximo mês porque os mananciais ainda não foram abastecidos devido aos meses com pouca chuva”.

Nessa época, a safra está crescendo e historicamente janeiro é o mês mais chuvoso nesta região. “Uma seca agora terá um peso maior do que uma seca em março ou abril, por exemplo. Na nossa região, o pasto, o milho e a cana serão prejudicados. O impacto na produtividade dessas culturas é certo, porém com intensidade diferenciada”. Marin lembra ainda que, no caso do milho, a cultura está numa fase sensível à falta de água, o que pode aumentar o impacto da seca. No caso da cana, é possível prever queda na produtividade nos canaviais da região em decorrência da seca, especialmente nos talhões com previsão de colheita no final da safra, entre outubro e dezembro de 2014.

No caso do pasto, a dinâmica de engorda do gado também pode ter consequências significativas. “O produtor brasileiro tradicionalmente deixa o gado no pasto para engordar e vende no início da seca, em abril e maio, para evitar o gasto com a suplementação. Neste ano, com pouca chuva em janeiro, o gado engordará menos e poderá exigir a venda mais cedo, ou seja, a estratégia de negócio poderá ser revista”.

Na horta – No caso das hortaliças, Marin lembra que a irrigação minimiza o problema de falta de chuva, mas não impede que a qualidade dos produtos seja afetada pelas altas temperaturas. “As verduras disponíveis nos supermercados já atestam os efeitos do calor. As folhas estão amargas e duras, além da falta de algumas leguminosas como mandioquinha e a salsinha, por exemplo”.

A professora Simone da Costa Mello, do Departamento de Produção Vegetal (LPV), explica que, no caso da alface, o calor acelera o crescimento e, como mecanismo de defesa, as folhas ficam mais grossas, com aspecto plastificado. “As temperaturas mais altas estimulam a produção de látex nas folhas de alface”, comenta a docente.

Outra hortaliça que sofre com o calor é o tomate. De acordo com a professora Simone Mello, tanto a alface quanto o tomate são de climas temperados e, no caso do tomate, o calor produz distúrbios fisiológicos facilmente observados. “No verão em geral a absorção de cálcio pelo fruto do tomate é prejudicado, uma vez que as folhas acabam atraindo essa substância para o processo respiratório, o que facilita o aparecimento de lesões na porção apical do fruto. A oscilação de temperatura também pode facilitar o surgimento de rachaduras”.

Gado – No caso da pecuária, Luiz Gustavo Nussio, docente do Departamento de Zootecnia (LZT) da ESALQ, lembra que o calor afeta drasticamente o metabolismo do animal. “Com as altas temperaturas, o gado tem dificuldade de liberar calor e, portanto, aumenta sua temperatura corporal, sua frequência respiratória, além de diminuir o consumo alimentar, o que faz diminuir a produtividade de leite e carne”.

Posto Meteorológico – Localizado no Campus “Luiz de Queiroz”, o Posto Meteorológico da ESALQ é de responsabilidade do Departamento de Engenharia de Biossistemas (LEB). O posto teve suas atividades iniciadas em 1917, quando as medidas de precipitação e temperatura do ar começaram a ser registradas na estação convencional. A partir de 1926, foram introduzidas as medidas de insolação e irradiância solar global e, em 1943, as medidas de velocidade do vento, umidade relativa do ar, pressão atmosférica e evaporação. Na mesma área, e também sob responsabilidade do LEB, opera uma estação meteorológica automática, a qual começou a funcionar em 1997. Esta é composta de sensores eletrônicos acoplados a um sistema de aquisição de dados (datalogger), que registra e armazena as diversas variáveis agrometeorológicas. Os dados meteorológicos, tanto da estação convencional (diários e mensais) quanto da automática (15 minutos, diários e mensais), podem ser consultados no site do LEB.

Texto: Caio Albuquerque (29/01/2014)

Boletim 08