Orvalho —
Entretanto, explica o especialista Antonio Carlos Zuffo, da Unicamp, a vegetação exerce esse
papel não tanto na beira dos rios, onde o solo já está encharcado, mas um pouco mais longe, até mesmo
nos topos de morros, onde ela também intercepta a umidade trazida pelas nuvens, que condensa na
forma de orvalho e desce subterraneamente até as nascentes. Será preciso ir além da mata ciliar. Zuffo
propõe, por exemplo, o plantio direto, em vez do arado, como forma de evitar a compactação.
Ricardo Rodrigues, da Esalq, a Escola de Agronomia da USP, acha que não é necessário plantar 30
milhões de mudas. Onde houver vegetação por perto, é possível induzir a regeneração natural. Com base
em sua experiência com recomposição de florestas, Rodrigues estima que 50% da área precisaria de
plantio total, com custo médio de R$ 9 mil por hectare; 25% se regeneraria sozinha, ao custo de R$ 2
mil/ha.; os restantes 25% requereriam enriquecimento com espécies, o que custa R$ 3 mil/ha. Caberia aos
fazendeiros cercar o gado.
Por esse cálculo aproximado, o projeto custaria R$ 195,5 milhões. Bilhões de reais devem ser gastos nas
obras de engenharia anunciadas pelo governo. Só a transposição entre as Represas Jaguari, da Bacia do
Paraíba do Sul, e Atibainha, do Sistema Cantareira, está estimada em R$ 830,5 milhões. Para Assad e
Rodrigues, a recuperação da mata nativa começaria a ter efeitos sobre o Cantareira em cinco anos.
A relação entre a vegetação e as chuvas em regiões de Mata Atlântica, como a do Cantareira, ainda está
sendo estudada cientificamente, afirma o meteorologista Carlos Nobre. Na Amazônia, já foi provado o
efeito da transpiração das árvores. Ontem, mesmo sem chuva, o manancial teve a 16.ª alta e chegou a
10,2% da capacidade.
A Sabesp incentiva o plantio de mata nativa no entorno das represas, por empresas que precisam fazer
compensação ambiental. A Dersa plantou 1,13 milhão de mudas em 554 hectares. O governo paulista
lançou no mês passado o programa Mata Ciliar, que pretende recuperar 20 mil hectares, com recursos de
empreendedores em busca de licença ambiental, ou de proprietários que precisem se regularizar.
Em Bragança Paulista, onde restam apenas 11% de cobertura vegetal, o prefeito Fernão Dias (PT) criou
um programa no qual os infratores ambientais regularizam sua situação bancando o plantio de árvores.
"Em menos de dois anos, já fizemos mais de 30 mil plantios." O prefeito acha provável que haja
resistência dos condomínios e fazendeiros a um eventual programa de recomposição da mata ciliar. "Eles
perderão boa parte de sua área, mas se trata de um momento emergencial, em que o Brasil não pode
manter um benefício individual em detrimento do coletivo."
(Com Estadão Conteúdo)