Recenseamento de capivaras fora do Campus

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AVALIAÇÃO DA POSSÍVEL CONECTIVIDADE ENTRE OS GRUPOS DE CAPIVARAS DO CAMPUS LUIZ DE QUEIROZ E DE SUA VIZINHANÇA

 

A capivara (Hydrochoerus hydrochaeris) é um mamífero relativamente comum em várias partes do Brasil, inclusive no município de Piracicaba. É um animal semiaquático, de hábitos variados, sendo usualmente mais ativas à noite. É o maior roedor do mundo. Alimenta-se principalmente certas gramíneas (o nome “capivara” vem do tupi “comedor de capim”), podendo também ingerir certas plantas de outros grupos. Com base em estudos anteriores, sabe-se que cerca de 12 grupos de capivaras vivem no Câmpus Luiz de Queiroz, da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, da Universidade de São Paulo (ESALQ-USP). Estes correspondem a um total de 350 – 400 animais, que vivem principalmente nas proximidades dos corpos d´água.

A capivara é um dos principais hospedeiros do carrapato-estrela (Amblyomma sculptum Berlese, 1888), podendo dispersá-lo por áreas extensas, dada sua grande movimentação diária em busca de alimento. Este carrapato é vetor da bactéria Rickettsia rickettsii, causadora da doença de seres humanos conhecida como febre maculosa, que tem anualmente causado a morte de várias pessoas no estado de São Paulo, inclusive na região de Piracicaba. Nos últimos anos, a ESALQ tem dispendido esforços no sentido de restringir a área de movimentação das capivaras, evitando que estas frequentem as áreas de maior circulação dos estudantes, visitantes ou trabalhadores do Câmpus Luiz de Queiroz.

Como o isolamento total do câmpus de seus vizinhos não é possível, especialmente ao longo do Rio Piracicaba e do Ribeirão Piracicamirim, surgiu então a dúvida: qual a possibilidade de que as ações realizadas no câmpus, para prevenir a ocorrência da febre maculosa, possa afetar negativamente seus vizinhos? A movimentação periódica das capivaras do câmpus para a vizinhança e desta para o câmpus já é conhecida. Mas podem aquelas ações levar à migração das capivaras para fora do câmpus?

Em princípio, a hipótese é de que não, tendo em vista a grande área de mata ciliar do câmpus, que oferece alimento suficiente para as capivaras se manterem neste. Pelo contrário, espera-se que ao longo do tempo as ações conduzidas resultem em redução da incidência da febre maculosa no câmpus e em suas proximidades, pela esperada redução do número de capivaras para um patamar menor, compatível com a redução de sua farta alimentação até recentemente provida pelas plantas ou rações.

No entanto, para comprovar aquela hipótese, tem sido considerado prioritário o monitoramento do fluxo e possível ocupação de capivaras e carrapatos no entorno do câmpus , permitindo a tomada de medidas em tempo hábil, na eventual detecção de migrações anormais.

O monitoramento foi iniciado em Julho de 2017, não tendo prazo para terminar. Este é feito ao longo de corpos d´água que conectam o câmpus ao restante do município, ou seja, nos trechos de cerca de:
a)
5 km entre o viaduto da Rodovia Luiz de Queiroz sobre o Ribeirão Piracicamirim e o Supermercado Coop, ao longo do Ribeirão Piracicamirim (das proximidades da Vila Independência e do Jardim Brasília até os arredores dos bairros Jardim Elite e Jardim Nova América);
b)
2 km entre a Ponte do Shopping e o Museu da Água, ao longo do Rio Piracicaba; e
c)
1,5 km ao longo do Rio Piracicaba, dentro da empresa Oji Papeis Especiais (Figura 1).

O trabalho é realizado pelo bolsista Luis Guilherme de Queiroz, com o apoio do técnico de campo da ESALQ, Josenilton Luis Mandro, frequentemente em colaboração com estagiários do setor de Acarologia do Departamento de Entomologia e Acarologia, sob a supervisão do Professor Doutor Gilberto Moraes, do citado departamento. Cada avaliação é feita por pessoas devidamente protegidas por EPIs (macacão branco e botas lacradas com fita adesiva). Anualmente, três campanhas de monitoramento são realizadas.

As capivaras são monitoradas por observações diretas regulares no período diurno, de acordo com o protocolo do IBAMA-MMA (2006), sendo assim realizadas em cada campanha 10 avaliações sucessivas espaçadas de pelo menos dois dias uma de outra. Um a dois avaliadores caminham ao longo de cada margem do rio/ ribeirão, procurando pelas capivaras e vestígios de sua movimentação, como montículos de fezes, pegadas e trilhas. Por serem as capivaras mais ativas no período noturno, e por ser relativamente estreita a faixa de vegetação ao longo dos trechos considerados, o monitoramento é feito usualmente no período da manhã, pela maior facilidade em visualizá-las. A duração de cada monitoramento é de 2-3 horas.

Em complementação, são feitas também observações esporádicas noturnas e por câmeras trap instaladas em locais estratégicos. As avaliações noturnas são feitas a cada 2-3 semanas ao longo do ano, percorrendo-se a avenida ao longo dos trechos 1 e 2 (ambos os lados da Avenida Prof. Alberto Vollet Sachs e Avenida Renato Wagner, respectivamente), com um veículo, procurando-se pelos animais. Em cada ocasião, consultam-se também os frentistas dos 2 postos ao longo da Avenida Prof. Alberto Vollet Sachs, perguntando sobre a eventual visualização destes animais entre uma avaliação e outra. Uma câmara trap é mantida nas proximidades da ESALQ-Log e outra nas proximidades do viaduto da Rodovia do Açúcar e a empresa Oji Papeis Especiais (uma câmara era mantida nas proximidades da ponte do Shopping, mas esta foi retirada por razões de segurança).

Cada avaliação de carrapatos é feita ao final de cada campanha de avaliação de capivaras. Os carrapatos são monitorados pelo uso de duas técnicas, conhecidas como uso de armadilhas de gelo seco e com o uso do pano de arrasto.

As armadilhas de gelo seco são mais indicadas para a constatação da presença de ninfas e adultos. Cada armadilha consiste de um quadrado de tecido branco, de aproximadamente 40 x 40 cm, sobre o qual se põe aproximadamente 250 g de gelo seco. A sublimação do gelo seco resulta na liberação do gás carbônico, com a consequente atração do carrapato em direção ao tecido. Nos trechos 1 e 2, monitoramento é realizado com 10 armadilhas de cada lado do rio/ ribeirão, sendo a distância entre estas variável, concentrando- as nos locais com maior probabilidade de encontrar o carrapato-estrela (Figuras 2 e 3). No trecho 3, todas as 20 armadilhas são colocadas no lado esquerdo do rio, sendo 10 bem próximas à margem e as outras 10 na região que corresponde à subestação da empresa Oji Papeis Especias (Figura 4). Estas são colocadas preferencialmente em lugares sombreados, a cerca de pelo menos 5 m da margem do rio/ ribeirão.

Duas avaliações com o pano de arrasto são realizadas, no período em que a avaliação com a armadilha de gelo seco está sendo feita. Este método é mais indicado para a determinação da presença de larvas, devido à menor locomoção destas no ambiente, mas larvas e adultos são também capturadas. O pano tem aproximadamente 1,5 x 0,5 m, sendo fixado por um dos lados mais curtos a uma haste  (aproximadamente 1 m de comprimento), como uma bandeira. Arrastar o pano na vegetação rasteira em um percurso de aproximadamente 1,5 m define uma “bandeirada”. São feitas 10 bandeiradas nas proximidades de cada armadilha de gelo seco.

 

Figura 1. Percursos onde está sendo conduzido o trabalho. Fonte: Google Maps.

 

Figura 2. Pontos de coleta do trecho 1 (Ribeirão Piracicamirim). Fonte: Google Maps.

 

Figura 3. Pontos de coleta do trecho 2 (Rio Piracicaba, próximo ao Shopping). Fonte: Google Maps.

 

Figura 4. Pontos de coleta do trecho 3 (Rio Piracicaba, bairro Monte Alegre). Fonte: Google Maps.

 

Agradecimentos:

Ao técnico de campo Josenilton Luis Mandro e aos estagiários João Pedro Ignez Martin, Felipe Levorato Carmezini e Alan Ferreira Nunes pela imensa ajuda nas atividades.

Agradecimentos especiais à empresa Oji Papeis Especiais pela enorme colaboração na pesquisa.

Agradecimentos especiais à Comissão Técnica Permanente de Controle e Prevenção da Febre Maculosa pelo apoio técnico e pelo incentivo.